"Os obstáculos para a harmonia da convivência humana não são apenas de ordem jurídica, ou seja, devidos à falta de leis que regulem esse convívio; dependem de atitudes mais profundas, morais, espirituais, do valor que damos à pessoa humana, de como consideramos o outro." (Chiara Lubich)

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

INFORMATIVO 759

INFORMATIVO 759 – ASPECTOS QUE ENVOLVEM DIREITO CONSTITUCIONAL – PROF. CLARA MACHADO

PLENÁRIO


Agência reguladora estadual e destituição de dirigentes –  ADI 1949/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 17.9.2014. (ADI-1949)

Ø  Ofensa ao princípio da separação de Poderes (CF, art. 2º) -  inconstitucionalidade do art. 8º da Lei 10.931/1997, do Estado do Rio Grande do Sul que prevê a destituição, no curso do mandato, de dirigentes da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul - AGERGS por decisão exclusiva da assembleia legislativa.
Ø  O Tribunal aduziu que o legislador infraconstitucional não poderia criar ou ampliar os campos de intersecção entre os Poderes estatais constituídos, sem autorização constitucional, como no caso em que extirpa a possibilidade de qualquer participação do governador na destituição de dirigente de agência reguladora e transfere de maneira ilegítima, a totalidade da atribuição ao Poder Legislativo local.
Ø  Afirmou que a natureza da investidura a termo no referido cargo, bem assim a incompatibilidade da demissão “ad nutum” com esse regime, exigiriam a fixação de balizas precisas quanto às situações de demissibilidade dos dirigentes dessas entidades. A Corte destacou que, em razão do vácuo normativo resultante da inconstitucionalidade da legislação estadual, fixaria, enquanto perdurasse a omissão normativa, hipóteses específicas de demissibilidade dos dirigentes da entidade.
Ø  No ponto, foi além do que decidido na medida cautelar (noticiada no Informativo 171), para estabelecer, por analogia ao que disposto na Lei federal 9.986/2000, que a destituição desses dirigentes, no curso dos mandatos, dar-se-ia em virtude de:
a) renúncia;
b) condenação judicial transitada em julgado; ou
c) processo administrativo disciplinar, sem prejuízo da superveniência de outras possibilidades legais, desde que observada a necessidade de motivação e de processo formal, sem espaço para discricionariedade pelo chefe do Executivo.
Ø  O Colegiado assentou, também, a constitucionalidade do art. 7º da aludida lei gaúcha, que determina a prévia aprovação da indicação pela assembleia legislativa para nomeação e posse dos dirigentes da autarquia. Asseverou que a Constituição permite que a legislação condicione a nomeação de determinados titulares de cargos públicos à prévia aprovação do Senado Federal (art. 52, III), aplicável aos Estados-membros, por simetria.

ADI e competência legislativa –  ADI 1499/PA, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.9.2014. (ADI-1499)

Ø  O Plenário confirmou medida cautelar (noticiada no Informativo 43) e julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 300 da Constituição do Estado do Pará e da Lei Complementar paraense 31/1996. As normas impugnadas dispõem, respectivamente, sobre populações indígenas e instituição do Conselho Estadual Indigenista - Conei, com a imposição de atribuições ao Ministério Público estadual. O Tribunal reiterou a competência privativa da União para legislar sobre a matéria, bem como a missão institucional do Ministério Público Federal para a defesa dos direitos e interesses dessas populações.

ADI e competência legislativa –  ADI 1972/RS, rel. Min. Teori Zavascki, 18.9.2014. (ADI-1972)

Ø  Por afronta ao art. 22, XI, da CF, o Plenário confirmou medida cautelar (noticiada no Informativo 153) e julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.311/1999, do Estado do Rio Grande do Sul, que dispõe sobre a inspeção técnica de veículos naquela unidade federada. O Tribunal destacou que a assembleia legislativa, ao disciplinar tema inserido na noção conceitual de trânsito, atuara com excesso no exercício de sua competência normativa. Salientou, ainda, que a matéria não se confundiria com a denominada “política de educação para segurança no trânsito”, prevista no art. 23, XII, da CF.

ADI: lei estadual e vício de iniciativa - ADI 2799/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 18.9.2014. (ADI-2799)

Ø  O Plenário confirmou medida cautelar (noticiada no Informativo 342) e julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.605/2001 do Estado do Rio Grande do Sul. A referida lei, de iniciativa parlamentar, versa sobre programa estadual de desenvolvimento do cultivo e aproveitamento da cana-de-açúcar e dispõe sobre a estrutura de órgão da administração pública.
Ø  O Tribunal consignou que haveria vício de iniciativa em relação à referida norma, na medida em que seria atribuição do chefe do Poder Executivo deflagrar o processo legislativo que envolvesse órgão da administração pública, nos termos do art. 61, §1º, II, e, da CF.

Inconstitucionalidade de lei e decisão monocrática –  RE 376440 ED/DF, rel. Min. Dias Toffoli, 18.9.2014. (RE-376440)

Ø  É possível o julgamento de recurso extraordinário por decisão monocrática do relator nas hipóteses oriundas de ação de controle concentrado de constitucionalidade em âmbito estadual de dispositivo de reprodução obrigatória, quando a decisão impugnada refletir pacífica jurisprudência do STF sobre o tema.
Ø  Com base nessa orientação, por maioria, o Plenário recebeu os embargos de declaração como agravo regimental e a este negou provimento. Na espécie, tratava-se de declaratórios opostos de decisão monocrática proferida pelo Ministro Dias Toffoli (CPC, art. 557, § 1º, a), na qual assentada — com fundamento na jurisprudência consolidada da Corte — a inconstitucionalidade de lei que dispõe sobre a criação de cargos em comissão para funções que não exigissem o requisito da confiança para o seu preenchimento. Na mencionada decisão, o relator destacara que os cargos, consoante a norma impugnada, deveriam ser ocupados por pessoas determinadas conforme a descrição nela constante — v. Informativo 707.
Ø   Em acréscimo, o Ministro Teori Zavascki, tendo em conta a natureza objetiva do recurso extraordinário nesses casos, destacou que o procedimento se justificaria pelas mesmas razões que autorizariam a dispensa da cláusula da reserva de plenário (CPC, art. 481, parágrafo único), invocáveis por analogia.
Ø  Observou, também, que a análise pelo órgão colegiado não estaria excluída, pois poderia ser provocada por recurso interno. Vencido o Ministro Marco Aurélio quanto à conversão e ao mérito. Destacava impossibilidade de o relator, monocraticamente, julgar o tema de fundo de processo objetivo a envolver controvérsia constitucional.

REPERCUSSÃO GERAL

Serviços sociais autônomos e exigência de concurso público – RE 789874/DF, rel. Min. Teori Zavascki, 17.9.2014. (RE-789874)

Ø  Os serviços sociais autônomos, por possuírem natureza jurídica de direito privado e não integrarem a Administração Pública, mesmo que desempenhem atividade de interesse público em cooperação com o ente estatal, não estão sujeitos à observância da regra de concurso público (CF, art. 37, II) para contratação de seu pessoal. Essa a conclusão do Plenário, que negou provimento a recurso extraordinário no qual se discutia a necessidade de realização de concurso público para a contratação de empregados por pessoa jurídica integrante do chamado “Sistema S”.
Ø  No mérito, o Tribunal lembrou que a configuração jurídica dessas entidades relacionadas aos serviços sociais teriam sido expressamente recepcionadas pelo art. 240 da CF e pelo art. 62 do ADCT. Recordou ainda que os serviços sociais do Sistema “S” (SEST - Serviço Social do Transporte; SESCOOP - Serviço Nacional de Aprendizagem no Cooperativismo; SESC - Serviço Social do Comércio; SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem; SESI - Serviço Social da Indústria; SENAI - Serviço de Aprendizado Industrial; e SENAR - Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), vinculados às entidades patronais de grau superior e patrocinados, basicamente, por recursos recolhidos do próprio setor produtivo beneficiado, teriam inegável autonomia administrativa. Asseverou que essa autonomia teria limites no controle finalístico exercido pelo TCU quanto à aplicação dos recursos recebidos, sujeição que decorreria do art. 183 do Decreto-lei 200/1967 e do art. 70 da Constituição.
Ø  Ademais, mencionou que, no caso concreto, a entidade estaria sujeita às auditorias a cargo do Ministério dos Transportes e à aprovação de seus orçamentos pelo Poder Executivo. Assinalou que a não obrigatoriedade de submissão das entidades do denominado Sistema “S” aos ditames constitucionais do art. 37, notadamente ao seu inciso II, não as eximiria de manter um padrão de objetividade e eficiência na contratação e nos gastos com seu pessoal. Enfatizou que essa exigência traduziria um requisito de legitimidade da aplicação dos recursos arrecadados na manutenção de sua finalidade social, porquanto entidades de cooperação a desenvolver atividades de interesse coletivo.
Ø  A Corte enunciou as características básicas desses entes autônomos:
a) dedicam-se a atividades privadas de interesse coletivo cuja execução não é atribuída de maneira privativa ao Estado;
b) atuam em regime de mera colaboração com o Poder Público;
c) possuem patrimônio e receita próprios, constituídos, majoritariamente, pelo produto das contribuições compulsórias que a própria lei de criação institui em seu favor; e
d) possuem a prerrogativa de autogerir seus recursos, inclusive no que se refere à elaboração de seus orçamentos, ao estabelecimento de prioridades e à definição de seus quadros de cargos e salários, segundo orientação política própria.
Ø  Alertou para a necessidade de não se confundir essas entidades e tampouco equipará-las a outras criadas após a CF/1988, como a Associação dos Pioneiros Sociais - APS; a Agência de Promoção de Exportações do Brasil - APEX; e também a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial - ABDI, cuja configuração jurídica teria peculiaridades próprias:
a) criadas por autorização de lei e implementadas pelo Poder Executivo, não por entidades sindicais;
b) não destinadas a prover prestações sociais ou de formação profissional a determinadas categorias de trabalhadores, mas a atuar na prestação de assistência médica qualificada e na promoção de políticas públicas de desenvolvimento setoriais;
c) financiadas, majoritariamente, por dotações consignadas no orçamento da União;
d) obrigadas a gerir seus recursos de acordo com os critérios, metas e objetivos estabelecidos em contrato de gestão cujos termos seriam definidos pelo próprio Poder Executivo; e
e) supervisionadas pelo Poder Executivo, quanto à gestão de seus recursos. Feitas essas considerações, o Colegiado pontuou que, embora o recorrido tenha sido criado após a CF/1988, a natureza das atividades por ele desenvolvidas, a forma de financiamento e o regime de controle a que estaria sujeito o enquadrariam no conceito original de serviço social autônomo, vinculado e financiado por determinado segmento produtivo.
Ø  Concluiu, assim que, em razão de sua natureza jurídica de direito privado e não integrante da Administração Pública, direta ou indireta, a ele não se aplicaria o inciso II do art. 37 da Constituição.
Ø  Registrou que a ausência de imposição normativa de observância obrigatória dos princípios gerais da Administração Pública na contratação de pessoal, não se aplicaria a certos serviços sociais (como APS, APEX e ABDI) e outras espécies de entidades colaboradoras com o Poder Público, cuja disciplina geral imporia a adoção desses princípios. Precedentes citados: ADI 1.864/PR (DJe de 2.5.2008); ARE 683.979/DF (DJe de 23.8.2012); RE 366.168/SC (DJU de 14.5.2004) e AI 349.477 AgR/PR (DJU de 28.2.2003).

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