INFORMATIVO 770 – ASPECTOS QUE
ENVOLVEM DIREITO CONSTITUCIONAL – PROF. CLARA MACHADO
Plenário
Verba indenizatória e
publicidade – MS 28178/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 3.12.2014. (MS-28178)
Ø O
Ministro Roberto Barroso (relator) concedeu a ordem para que o Senado forneça à
impetrante cópia reprográfica dos documentos comprobatórios do uso da verba
indenizatória solicitados, no que foi acompanhado pelos Ministros Teori
Zavascki, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Marco Aurélio. De início, reconheceu a
legitimidade ativa da impetrante, por considerar que os veículos de imprensa
teriam direito líquido e certo à obtenção desses elementos, com base no
princípio da publicidade (CF, art. 37, “caput”) e em outras disposições
constitucionais correlatas, notadamente a liberdade de informação jornalística
(CF, art. 220, § 1º).
Ø Ressaltou
que as referidas verbas destinar-se-iam a indenizar despesas diretas e
exclusivamente relacionadas ao exercício da função parlamentar. Sua natureza
pública estaria presente tanto na fonte pagadora — o Senado Federal — quanto na
finalidade, vinculada ao exercício da representação popular.
Ø A regra geral
seria a publicidade e decorreria de um conjunto de normas constitucionais, como
o direito de acesso à informação por parte dos órgãos públicos (CF, art. 5º,
XXXIII) — especialmente no tocante à documentação governamental (CF, art. 216,
§ 2º) —, o princípio da publicidade (CF, art. 37, “caput” e § 3º, II) e o princípio republicano (CF, art. 1º), do
qual se originariam os deveres de transparência e prestação de contas, bem como
a possibilidade de responsabilização ampla por eventuais irregularidades.
Ø Recordou que o art. 1º, parágrafo único, da CF enuncia que
“todo o poder emana do povo”.
Assim, os órgãos estatais teriam o dever de esclarecer ao seu mandante, titular
do poder político, como seriam usadas as verbas arrecadadas da sociedade para o
exercício de suas atividades. Observou que a
Constituição ressalvaria a regra da publicidade apenas em relação às
informações cujo sigilo fosse
imprescindível à segurança da sociedade e do Estado (CF, art. 5º,
XXXIII, parte final) e às que fossem protegidas pela inviolabilidade conferida
à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas (CF, art. 5º, X, c/c
art. 37, § 3º, II). Por se tratar de
situações excepcionais, o ônus argumentativo de demonstrar a caracterização de
uma dessas circunstâncias incumbiria a quem pretendesse afastar a regra geral
da publicidade.
Ø Quanto à segunda exceção que justificaria a restrição à
publicidade — informações relacionadas à intimidade, vida privada, honra e
imagem das pessoas —, entendeu não ser pertinente que se invocasse a
intimidade, de forma genérica, para restringir a transparência acerca do
emprego de verbas públicas exclusivamente
relacionadas ao exercício da função parlamentar. Salientou que a hipótese nada teria a
ver com uma devassa genérica na vida privada dos agentes políticos. Não se
cuidaria da divulgação, pelo Poder Público, da forma como os senadores
gastariam o subsídio recebido a título de remuneração ou mesmo sobre o emprego
de outras rendas privadas auferidas a título diverso.
Repercussão Geral
RE com repercussão geral
reconhecida e ausência de preliminar formal - RE 684261/PR, rel. Min. Luiz
Fux, 3.12.2014. (RE-684261)
Ø O Ministro Marco Aurélio suscitou questão de ordem
no sentido de não conhecer do recurso, por ausência de preliminar sobre a
existência de repercussão geral do tema, no que foi acompanhado pelos Ministros
Teori Zavascki, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Constatara que as razões recursais
teriam sido silentes quanto a esse requisito, que sequer fora abordado.
Ponderou que, embora o Plenário tivesse assentado a repercussão geral, esse
defeito formal implicaria o não conhecimento do recurso extraordinário.
Ø Os Ministros Luiz Fux (relator), Ricardo
Lewandowski (Presidente), Roberto Barroso e Gilmar Mendes, em divergência,
conheceram do recurso. Para o relator, as modernas legislações seriam no
sentido de que, se o mérito do recurso contribuísse para a evolução do Direito,
qualquer defeito formal deveria ser afastado para que esse processo tivesse um
cunho objetivo e que se pudesse julgar a tese. Assim, a despeito da ausência do
capítulo específico da repercussão geral, teria sido possível extrair o tema em
debate.
Ø Ademais, a matéria fora chancelada pelo Plenário
virtual. Em seguida, o relator indicou adiamento.
Responsabilidade civil do
Estado: superpopulação carcerária e dever de indenizar – Mínimo existencial e
reserva do possível. -RE 580252/MS, rel. Min. Teori Zavascki, 3.12.2014.
(RE-580252)
Ø O
Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário em que discutida a
responsabilidade do Estado e o consequente dever de indenizar, por danos
morais, o cidadão preso e submetido a tratamento desumano e degradante pela excessiva
população carcerária. No caso, o tribunal de origem entendera caracterizado o
dano moral porque, após realizado laudo de vigilância sanitária no presídio e
decorrido lapso temporal, não teriam sido sanados problemas de superlotação e
de falta de condições mínimas de saúde e de higiene do estabelecimento penal.
Considerara, ainda, que não assegurado o mínimo existencial, não se poderia
aplicar a teoria da reserva do possível.
Ø O
Ministro Teori Zavascki (relator) deu provimento ao recurso, por reputar
presente a responsabilidade civil do Estado, no que foi acompanhado pelo
Ministro Gilmar Mendes. O relator registrou, de início, não haver qualquer
controvérsia a respeito dos fatos da causa. Pontuou que o próprio acórdão
recorrido reconhecera a precariedade do sistema penitenciário estadual, que
teria lesado direitos fundamentais do recorrente, quanto à dignidade,
intimidade, higidez física e integridade psíquica. Assim, situada a matéria
jurídica no âmbito da responsabilidade civil do Estado, cabe a ele responder
pelos danos causados por ação ou omissão de seus agentes, em face da autoaplicabilidade do art. 37, § 6º, da
CF, que não se sujeitaria a intermediação legislativa ou a providência
administrativa de qualquer espécie. Ocorrido o dano e estabelecido o
seu nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes, nasceria a
responsabilidade civil do Estado. Logo,
reconhecido o dever estatal, imposto pelo sistema normativo, de manter em seus
presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico,
seria também responsabilidade do Poder Público ressarcir os danos, inclusive
morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou
insuficiência das condições legais de encarceramento.
Ø O
relator asseverou que as violações a direitos fundamentais causadoras de danos
pessoais a detentos em estabelecimentos carcerários não poderiam ser relevadas
ao argumento de que a indenização não teria o alcance para eliminar o grave
problema prisional globalmente considerado, dependente da definição e da
implantação de políticas públicas específicas, providências de atribuição
legislativa e administrativa, não de provimentos judiciais. Aduziu que,
admitida essa assertiva, significaria justificar a perpetuação da desumana
situação constatada em presídios como aquele em que cumpre pena o recorrente. A criação de subterfúgios teóricos —
como a separação dos Poderes, a reserva do possível e a natureza coletiva dos
danos sofridos — para afastar a responsabilidade estatal pelas calamitosas
condições da carceragem afrontaria não apenas o sentido do art. 37, § 6º, da
CF, como determinaria o esvaziamento das inúmeras cláusulas constitucionais e
convencionais [Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das
Nações Unidas; Convenção Americana de Direitos Humanos; Princípios e Boas
Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas contida
na Resolução 1/2008, aprovada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos;
Convenção da ONU contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos
ou Degradantes; Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros (adotadas no
1º Congresso das Nações Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento de
Delinqüentes)]. O descumprimento reiterado dessas cláusulas se transformaria em
mero e inconsequente ato de fatalidade, o que não poderia ser tolerado. Enfatizou que a invocação seletiva de
razões de Estado para negar, especificamente a determinada categoria de
sujeitos, o direito à integridade física e moral, não seria compatível com o
sentido e o alcance do princípio da jurisdição. Acolher essas razões seria o
mesmo que recusar aos detentos os mecanismos de reparação judicial dos danos
sofridos, a descoberto de qualquer proteção estatal, em condição de
vulnerabilidade juridicamente desastrosa. Seria dupla negativa: do
direito e da jurisdição. A garantia mínima de segurança pessoal, física e
psíquica dos detentos constituiria inescusável dever estatal. Em seguida, pediu
vista dos autos o Ministro Roberto Barroso.
Medida
cautelar de afastamento de cargo público e cabimento de “habeas corpus” – HC
121089/AP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2.12.2014. (HC-121089)
Ø Afirmou
que inexistiria divergência teórica
quanto ao fato de o “habeas corpus” se destinar a proteger o indivíduo contra qualquer
medida restritiva à liberdade de ir, vir e permanecer (CF, art. 5º, LXVIII).
Ademais, a jurisprudência do STF seria prevalecente no sentido de que o aludido
remédio constitucional teria como escopo a proteção da liberdade de locomoção.
Seu cabimento teria parâmetros constitucionalmente estabelecidos,
justificando-se a impetração sempre que alguém sofresse, ou se achasse ameaçado
de sofrer, violência ou coação em sua liberdade de ir e vir, por ilegalidade ou
abuso de poder. Porém, a despeito da
força que essa interpretação teria assumido na sua jurisprudência, o STF,
quando do julgamento do HC 90.617/PE (DJe de 7.3.2008), decidira reintegrar
magistrado afastado do cargo por período além do razoável por força de decisão
em processo criminal. Dada a configuração fática daquele caso — constrangimento
ilegal decorrente de mora na prestação jurisdicional no âmbito processual
penal; persistência do afastamento cautelar em razão do recebimento da denúncia
pelo STJ; e afastamento do paciente por lapso temporal excessivo —, a ação
de “habeas corpus” seria a via processual adequada para o pleito.
Ø Portanto,
apesar das decisões em sentido contrário, se
o afastamento imposto decorresse de decisão em processo penal ou investigação
criminal, e houvesse dúvida quanto à justeza do tempo, seria cabível o “habeas
corpus”, porquanto se trataria, na hipótese, de um tipo de restrição associada
a processo criminal ou investigação criminal. Não se trataria,
portanto, de usar o referido “writ” constitucional para outro objeto diferente
daquilo que a Constituição preconizaria.
Ø No
caso em análise, mesmo que descontada a fase de investigação, o referido prazo
estaria ultrapassado. Há mais de dois anos teria sido superada a fase de
acusação e resposta na ação penal, a pender a análise da admissibilidade da
acusação, e nada indicaria demora imputável à defesa. Além disso, não haveria
sequer sinalização de data para julgamento pelo STJ. Ou seja, existiria justo
receio de que a medida tendesse a se tornar perene. Em seguida, pediu vista dos
autos a Ministra Cármen Lúcia.
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