"Os obstáculos para a harmonia da convivência humana não são apenas de ordem jurídica, ou seja, devidos à falta de leis que regulem esse convívio; dependem de atitudes mais profundas, morais, espirituais, do valor que damos à pessoa humana, de como consideramos o outro." (Chiara Lubich)

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

INFORMATIVO 770 - ASPECTOS CONSTITUCIONAIS

INFORMATIVO 770 – ASPECTOS QUE ENVOLVEM DIREITO CONSTITUCIONAL – PROF. CLARA MACHADO

Plenário

Verba indenizatória e publicidade – MS 28178/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 3.12.2014. (MS-28178)

Ø  O Ministro Roberto Barroso (relator) concedeu a ordem para que o Senado forneça à impetrante cópia reprográfica dos documentos comprobatórios do uso da verba indenizatória solicitados, no que foi acompanhado pelos Ministros Teori Zavascki, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Marco Aurélio. De início, reconheceu a legitimidade ativa da impetrante, por considerar que os veículos de imprensa teriam direito líquido e certo à obtenção desses elementos, com base no princípio da publicidade (CF, art. 37, “caput”) e em outras disposições constitucionais correlatas, notadamente a liberdade de informação jornalística (CF, art. 220, § 1º).
Ø  Ressaltou que as referidas verbas destinar-se-iam a indenizar despesas diretas e exclusivamente relacionadas ao exercício da função parlamentar. Sua natureza pública estaria presente tanto na fonte pagadora — o Senado Federal — quanto na finalidade, vinculada ao exercício da representação popular.
Ø  A regra geral seria a publicidade e decorreria de um conjunto de normas constitucionais, como o direito de acesso à informação por parte dos órgãos públicos (CF, art. 5º, XXXIII) — especialmente no tocante à documentação governamental (CF, art. 216, § 2º) —, o princípio da publicidade (CF, art. 37, “caput” e § 3º, II) e o princípio republicano (CF, art. 1º), do qual se originariam os deveres de transparência e prestação de contas, bem como a possibilidade de responsabilização ampla por eventuais irregularidades.
Ø  Recordou que o art. 1º, parágrafo único, da CF enuncia que “todo o poder emana do povo”. Assim, os órgãos estatais teriam o dever de esclarecer ao seu mandante, titular do poder político, como seriam usadas as verbas arrecadadas da sociedade para o exercício de suas atividades. Observou que a Constituição ressalvaria a regra da publicidade apenas em relação às informações cujo sigilo fosse imprescindível à segurança da sociedade e do Estado (CF, art. 5º, XXXIII, parte final) e às que fossem protegidas pela inviolabilidade conferida à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas (CF, art. 5º, X, c/c art. 37, § 3º, II). Por se tratar de situações excepcionais, o ônus argumentativo de demonstrar a caracterização de uma dessas circunstâncias incumbiria a quem pretendesse afastar a regra geral da publicidade.
Ø  Quanto à segunda exceção que justificaria a restrição à publicidade — informações relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas —, entendeu não ser pertinente que se invocasse a intimidade, de forma genérica, para restringir a transparência acerca do emprego de verbas públicas exclusivamente relacionadas ao exercício da função parlamentar. Salientou que a hipótese nada teria a ver com uma devassa genérica na vida privada dos agentes políticos. Não se cuidaria da divulgação, pelo Poder Público, da forma como os senadores gastariam o subsídio recebido a título de remuneração ou mesmo sobre o emprego de outras rendas privadas auferidas a título diverso.

Repercussão Geral

RE com repercussão geral reconhecida e ausência de preliminar formal - RE 684261/PR, rel. Min. Luiz Fux, 3.12.2014. (RE-684261)

Ø  O Ministro Marco Aurélio suscitou questão de ordem no sentido de não conhecer do recurso, por ausência de preliminar sobre a existência de repercussão geral do tema, no que foi acompanhado pelos Ministros Teori Zavascki, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Constatara que as razões recursais teriam sido silentes quanto a esse requisito, que sequer fora abordado. Ponderou que, embora o Plenário tivesse assentado a repercussão geral, esse defeito formal implicaria o não conhecimento do recurso extraordinário.
Ø  Os Ministros Luiz Fux (relator), Ricardo Lewandowski (Presidente), Roberto Barroso e Gilmar Mendes, em divergência, conheceram do recurso. Para o relator, as modernas legislações seriam no sentido de que, se o mérito do recurso contribuísse para a evolução do Direito, qualquer defeito formal deveria ser afastado para que esse processo tivesse um cunho objetivo e que se pudesse julgar a tese. Assim, a despeito da ausência do capítulo específico da repercussão geral, teria sido possível extrair o tema em debate.
Ø  Ademais, a matéria fora chancelada pelo Plenário virtual. Em seguida, o relator indicou adiamento.

Responsabilidade civil do Estado: superpopulação carcerária e dever de indenizar – Mínimo existencial e reserva do possível. -RE 580252/MS, rel. Min. Teori Zavascki, 3.12.2014. (RE-580252)

Ø  O Plenário iniciou julgamento de recurso extraordinário em que discutida a responsabilidade do Estado e o consequente dever de indenizar, por danos morais, o cidadão preso e submetido a tratamento desumano e degradante pela excessiva população carcerária. No caso, o tribunal de origem entendera caracterizado o dano moral porque, após realizado laudo de vigilância sanitária no presídio e decorrido lapso temporal, não teriam sido sanados problemas de superlotação e de falta de condições mínimas de saúde e de higiene do estabelecimento penal. Considerara, ainda, que não assegurado o mínimo existencial, não se poderia aplicar a teoria da reserva do possível.
Ø  O Ministro Teori Zavascki (relator) deu provimento ao recurso, por reputar presente a responsabilidade civil do Estado, no que foi acompanhado pelo Ministro Gilmar Mendes. O relator registrou, de início, não haver qualquer controvérsia a respeito dos fatos da causa. Pontuou que o próprio acórdão recorrido reconhecera a precariedade do sistema penitenciário estadual, que teria lesado direitos fundamentais do recorrente, quanto à dignidade, intimidade, higidez física e integridade psíquica. Assim, situada a matéria jurídica no âmbito da responsabilidade civil do Estado, cabe a ele responder pelos danos causados por ação ou omissão de seus agentes, em face da autoaplicabilidade do art. 37, § 6º, da CF, que não se sujeitaria a intermediação legislativa ou a providência administrativa de qualquer espécie. Ocorrido o dano e estabelecido o seu nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes, nasceria a responsabilidade civil do Estado. Logo, reconhecido o dever estatal, imposto pelo sistema normativo, de manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, seria também responsabilidade do Poder Público ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.
Ø  O relator asseverou que as violações a direitos fundamentais causadoras de danos pessoais a detentos em estabelecimentos carcerários não poderiam ser relevadas ao argumento de que a indenização não teria o alcance para eliminar o grave problema prisional globalmente considerado, dependente da definição e da implantação de políticas públicas específicas, providências de atribuição legislativa e administrativa, não de provimentos judiciais. Aduziu que, admitida essa assertiva, significaria justificar a perpetuação da desumana situação constatada em presídios como aquele em que cumpre pena o recorrente. A criação de subterfúgios teóricos — como a separação dos Poderes, a reserva do possível e a natureza coletiva dos danos sofridos — para afastar a responsabilidade estatal pelas calamitosas condições da carceragem afrontaria não apenas o sentido do art. 37, § 6º, da CF, como determinaria o esvaziamento das inúmeras cláusulas constitucionais e convencionais [Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas; Convenção Americana de Direitos Humanos; Princípios e Boas Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas contida na Resolução 1/2008, aprovada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Convenção da ONU contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes; Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros (adotadas no 1º Congresso das Nações Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento de Delinqüentes)]. O descumprimento reiterado dessas cláusulas se transformaria em mero e inconsequente ato de fatalidade, o que não poderia ser tolerado. Enfatizou que a invocação seletiva de razões de Estado para negar, especificamente a determinada categoria de sujeitos, o direito à integridade física e moral, não seria compatível com o sentido e o alcance do princípio da jurisdição. Acolher essas razões seria o mesmo que recusar aos detentos os mecanismos de reparação judicial dos danos sofridos, a descoberto de qualquer proteção estatal, em condição de vulnerabilidade juridicamente desastrosa. Seria dupla negativa: do direito e da jurisdição. A garantia mínima de segurança pessoal, física e psíquica dos detentos constituiria inescusável dever estatal. Em seguida, pediu vista dos autos o Ministro Roberto Barroso.

Medida cautelar de afastamento de cargo público e cabimento de “habeas corpus” – HC 121089/AP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2.12.2014.  (HC-121089)

Ø  Afirmou que inexistiria divergência teórica quanto ao fato de o “habeas corpus” se destinar a proteger o indivíduo contra qualquer medida restritiva à liberdade de ir, vir e permanecer (CF, art. 5º, LXVIII). Ademais, a jurisprudência do STF seria prevalecente no sentido de que o aludido remédio constitucional teria como escopo a proteção da liberdade de locomoção. Seu cabimento teria parâmetros constitucionalmente estabelecidos, justificando-se a impetração sempre que alguém sofresse, ou se achasse ameaçado de sofrer, violência ou coação em sua liberdade de ir e vir, por ilegalidade ou abuso de poder. Porém, a despeito da força que essa interpretação teria assumido na sua jurisprudência, o STF, quando do julgamento do HC 90.617/PE (DJe de 7.3.2008), decidira reintegrar magistrado afastado do cargo por período além do razoável por força de decisão em processo criminal. Dada a configuração fática daquele caso — constrangimento ilegal decorrente de mora na prestação jurisdicional no âmbito processual penal; persistência do afastamento cautelar em razão do recebimento da denúncia pelo STJ; e afastamento do paciente por lapso temporal excessivo —, a ação de “habeas corpus” seria a via processual adequada para o pleito.
Ø  Portanto, apesar das decisões em sentido contrário, se o afastamento imposto decorresse de decisão em processo penal ou investigação criminal, e houvesse dúvida quanto à justeza do tempo, seria cabível o “habeas corpus”, porquanto se trataria, na hipótese, de um tipo de restrição associada a processo criminal ou investigação criminal. Não se trataria, portanto, de usar o referido “writ” constitucional para outro objeto diferente daquilo que a Constituição preconizaria.
Ø  No caso em análise, mesmo que descontada a fase de investigação, o referido prazo estaria ultrapassado. Há mais de dois anos teria sido superada a fase de acusação e resposta na ação penal, a pender a análise da admissibilidade da acusação, e nada indicaria demora imputável à defesa. Além disso, não haveria sequer sinalização de data para julgamento pelo STJ. Ou seja, existiria justo receio de que a medida tendesse a se tornar perene. Em seguida, pediu vista dos autos a Ministra Cármen Lúcia.


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